Poluição pode ser maior dentro de casa que na rua

A qualidade do ar dentro de casa tende a ser muito pior do que fora delas e essa é uma realidade pouco conhecida. Muitos materiais usados na construção e na decoração, como aglomerados de madeira e alguns plásticos de móveis e revestimentos, liberam substâncias tóxicas no ar. No Brasil o problema é agravado pela tolerância das leis a produtos considerado perigosos pela legislação de vários países.

Em geral, as pessoas associam casa ou ambiente residencial com proteção. Mas o grau de contaminação do ar nos ambientes interiores pode facilmente superar o observado no exterior, mesmo nas cidades mais poluídas. Isso ocorre, em primeiro lugar, porque são raríssimas as residências que filtram o ar vindo de fora. Outro motivo é o caráter finito do volume da casa: imagine-se uma casa coberta por uma laje que emite a mesma quantidade de algum tipo de gás para dentro e para fora do ambiente no mesmo intervalo de tempo. É óbvio que a concentração desse gás, dentro da casa, será dezenas de milhares de vezes mais alta do que fora, onde o volume de ar é dezenas de milhares de vezes maior que o volume dentro da casa.

Alguns poluentes existem tanto dentro quanto fora das edificações, como os produtos originados no trânsito. Porém, há contaminantes muito mais freqüentes dentro das casas do que fora. São substâncias presentes em produtos de limpeza, tintas, materiais do mobiliário, insumos de máquinas (como impressoras) que emitem vapores e/ou partículas tóxicas. O quadro é agravado pelo caráter sedentário da vida da maioria das pessoas. Se consideradas oito horas de sono, oito de trabalho, duas para as refeições, duas para a televisão, uma para a higiene e mais meia hora (com otimismo) para o transporte, obtém-se um total de 21,5 horas do dia em ambiente fechado.

Origem dos contaminantes

São muitos os agentes que podem contaminar o ar das casas. Um dos maiores perigos está nas emissões do amianto, uma fibra usada até há alguns anos em caixas d’água. O pó liberado por esse material pode causar doenças pulmonares e até câncer. O uso do amianto é proibido em alguns estados brasileiros, mas a legislação federal estabelece apenas normas de segurança em sua fabricação, transporte e uso.

Móveis, artigos de decoração e peças de artesanato também contribuem para a poluição dentro de casas e edifícios em função dos materiais que utilizam: compensados e aglomerados; pranchas de fibra de média densidade (conhecidas pela sigla MDF) e pranchas com partículas orientadas (ou OSB). Esses produtos usam cola contendo formaldeído, substância que é liberada aos poucos no ambiente. O formaldeído causa dor de cabeça, náusea, irritação das mucosas e exacerbação de alergias. Segundo a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, a substância causa comprovadamente o câncer rinofaríngeo e há “indícios limitados” de sua implicação no câncer das fossas nasais e seios faciais, e indícios “fortes, mas não suficientes”, relacionados à leucemia.

Como o formaldeído, há várias outras substâncias que têm forma gasosa à temperatura ambiente (chamadas de substâncias voláteis) e aparecem com freqüência em construções e produtos novos. Exemplo é o apreciado ‘aroma de carro novo’, atribuído à presença de um composto volátil: o tolueno. Medição feita pela Universidade de São Paulo (encomendada pelo jornal Folha de S. Paulo) no interior de um automóvel lançado no país em 2007 registrou a concentração de 97 partes por milhão (ppm) dessa substância, quase o dobro do valor limite estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (50 ppm).

O cloreto de polivinila (PVC), material plástico muito usado em tubos para água fria e esgoto, e mais recentemente em forros, também preocupa. O material, polêmico pelo histórico de doenças que causa nos trabalhadores do setor, emite vapores comprovadamente cancerígenos durante seu uso, mas sua utilização na construção civil brasileira é crescente.

São conhecidos ainda os efeitos de agentes biológicos, como fungos e bactérias presentes no interior dos edifícios. Tais agentes estão associados a sistemas de aquecimento, ventilação e ar-condicionado cuja manutenção é falha, a alguns materiais naturais e a materiais de construção úmidos. Eles podem causar alergias, rinite, inflamação nos olhos e asma, entre outros problemas.

Arquitetos, administradores públicos e cientistas devem participar na busca de melhor qualidade do ar em interiores. Cabe aos arquitetos, por exemplo, promover o uso de materiais mais saudáveis nas edificações. Os administradores públicos, por sua vez, precisam aplicar a legislação existente e aperfeiçoá-la, dando tratamento adequado ao problema da qualidade de ar nos interiores. Para os cientistas, o tema apresenta grandes oportunidades de pesquisa, principalmente aquelas que dêem tratamento específico aos materiais usados no Brasil de acordo com as condições climáticas e ambientais encontradas aqui.

E à todas as pessoas que buscam valorizar espaços de moradia, lazer e trabalho, vale a dica: as cores e os materiais da moda não deveriam causar problemas à saúde!

Aloísio Leoni Schmid

Universidade Federal do Paraná

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