O romance Terras do Sem Fim foi escrito em agosto de 1942, na cidade de Montevidéu, capital do Uruguai, quando, em pleno Estado Novo, o autor encontrava-se exilado do país, por pertencer ao Partido Comunista. Foi traduzido para mais de vinte idiomas. O livro retrata a vida na região cacaueira, do ponto de vista de um romancista.
Minha Monografia de Especialização buscou no romance de Jorge Amado os pontos que seriam históricos. E eles foram muitos; mais do que eu poderia imaginar. No início da narrativa o escritor introduz o assunto com algumas palavras que justificam o romance. Ele afirma que, viveu sempre na esperança, até mesmo na certeza, de que “o dia de amanhã será melhor e mais belo”.
Jorge Amado
O romance está dividido em 6 partes: O Navio, A Mata (Atlântica), Gestação de Cidades, O Mar, A Luta (pelas terras do Sequeiro do Espinho) e O Progresso. Em cada parte destas, ele vai narrando, do ponto de vista romanesco, o modo como a região foi sendo povoada e alcançando o progresso.
A estória começa em Salvador, com a partida de um navio com destino a Ilhéus. No navio embarcaram Juca Badaró, que visita a terceira classe para recrutar novos trabalhadores cujo objetivo era a derrubada da mata do Sequeiro Grande e aproveita para impor seu costume de “mulherengo” afamado.
Viajam também os jogadores de pôquer, jogo muito difundido naquela época, e o principal deles, o Dr. João Magalhães, vigarista notório, que vivia do jogo, mas se dizia engenheiro militar. No final do livro casa-se com Don’Ana, filha de Sinhô Badaró. Enquanto o navio se afasta do porto, as conversas giram sobre o que os espera numa região tão nova, onde corre muito dinheiro, tem fama ao mesmo tempo de eldorado e paraíso para se fazer fortuna e coito de bandidos, aonde a maioria vai se dar mal. Logo nas primeiras páginas a conversa entre os passageiros é sobre a região que os espera e do que nela acontecia: terras, dinheiro, cacau e morte.
As conversas dos seus personagens apresentam a “filosofia” do autor, que se preocupa com um modo de vida melhor para os homens. O romance foi escrito na época de militância comunista de Jorge Amado.
Chegando a Ilhéus, ele passa a narrar a conquista da mata, uma mata majestosa e imponente que deslumbrava, seduzia e amedrontava os homens. Juca Badaró, com mão de ferro impõe aos homens seu poder de dominação. Já não há como recuar.
Aos poucos ele vai introduzindo cada personagem. O coronel Horácio da Silveira, Maneca Dantas, Juca e Sinhô Badaró, Dr. Virgilio, pois não poderia faltar a figura do advogado, aquele que, usando a Lei, protegia os interesses dos coronéis.
A narrativa vai num crescendo constante que leva para o desfecho final: a luta pela posse das terras do Sequeiro Grande. Ao mesmo tempo, ele narra a construção das cidades, a partir de aglomerados de casas nas sedes das principais fazendas.
O escritor dá grande destaque ao povoado de Ferradas, que ele apresenta como “feudo de Horácio”, e passagem obrigatória para os viajantes que se dirigiam a Vitória da Conquista. Fala da intenção de se levar a estrada de ferro até Ferradas, mas que nunca chegou lá, porque Horácio era seabrista, que no momento era oposição.
Dentro da sua narrativa encontramos os mais destacados pontos daquela época, na região cacaueira, como as fraudes eleitorais, os “caxixes”, as traições, os conceitos de valentia e covardia, a prostituição e etc.
Ele coloca como ponto de destaque, a figura feminina de Don’Ana Badaró, mulher que foi capaz de articular com o coronel Teodoro das Baraúnas, na ausência dos chefes da família, Sinhô e Juca, o incêndio do cartório para anular o “caxixe” realizado pelo coronel Horácio, juntamente com Dr. Virgilio, registrando a mata do Sequeiro Grande em nome de Horácio e de outros correligionários.
São muitos os personagens, são muitas as pessoas envolvidas na trama. No romance encontramos todas aquelas pessoas que fazem parte da vida de uma cidade: pessoas de bem, bandoleiros, oportunistas, prostitutas, famílias e pessoas de todos os tipos e matizes.
No final do romance, o coronel Horácio, praticamente obriga Virgilio a contratar um homem para matar Juca de tocaia. É demonstra a mentalidade da época, quando ele diz que um homem que manda matar é tido como corajoso, como se tivesse feito com suas próprias mãos. Ainda não havia polícia e justiça para organizar a vida pública. Mandava quem tinha mais poder e dinheiro. Este era o retrato daqueles anos no Brasil.
O autor fala das eleições, da ascensão do coronel Horácio ao governo local, através do seu candidato Maneca Dantas, da chegada do Bispo, da emancipação de Itabuna e de J.J. Seabra como novo governador da Bahia.
Na festa da chegada do Bispo, Dr. Rui, completamente bêbado, explica a sua teoria: “Em roça de cacau, nessas terras, meu filho, nasce até Bispo. Nasce estrada de ferro, nasce assassino, caxixe, palacete, cabaré, colégio, nasce teatro, nasce até Bispo… Essa terra dá tudo enquanto der cacau…”. Jorge Amado, apesar de ter vivido longe daqui, retratou muito bem a região. Este é o seu legado.
Por: Maria Luiza Heine
Maria Luiza Heine
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