O Terreiro de Odé, com 63 anos de história, com inegável contribuição ao patrimônio histórico, arquitetônico, político, cultural e principalmente turístico da cidade de Ilhéus, foi tombado pelo decreto 010/04 e esquecido, como são todos os importantes bens culturais de nosso estado. O governo Municipal, que tantos dividendos recebeu deste importante equipamento cultural e turístico, nada fez para que o mesmo pudesse hoje figurar como um dos mais importantes espaços de preservação da cultura e da história do povo negro, não só de nossa cidade, como do sul do estado da Bahia, por suas relações parentais religiosas com outros terreiros fora do eixo Ilhéus/Itabuna.
Há algum tempo atrás, li uma matéria, de minha eterna professora, Maria Luíza Heine, sobre o esquecimento proposital dado pelos historiadores baianos a tudo que não é ou não está na capital do estado, recôncavo ou região metropolitana, foi em um número especial do Diário de ilhéus, sobre cultura do dia 20 de agosto deste ano, fiquei extremamente incomodado com a matéria e sempre me perguntava o que poderia ser feito para mudar a situação, pois é, hoje estou fazendo. Na matéria a professora colocava a situação de total descaso pelos que escrevem nossa história, quando em uma matéria do dia sete de agosto do mesmo ano o Jornal A Tarde veiculava manchete “Igreja do século XVI pode desabar”, esta igreja, é a de nossa Senhora da Escada, primeira igreja erguida com pedras na Bahia, que fica no subúrbio ferroviário de salvador, o curioso, é que esta igreja é quase que idêntica a de Nossa Senhora Santana, erguida no engenho de mesmo nome, construído por Mem de Sá na década de 1540, no atual distrito do Rio do Engenho(hoje em processo de reconhecimento como remanescente de quilombo, através de iniciativa da Associação de Moradores do Rio do Engenho – AMORE e Associação dos Templos de Culto aos Orixás de Ilhéus, com processo tramitando no Ministério da cultura/Fundação Cultural Palmares, que inclusive visitou o local no último dia 22 de outubro, após proferir palestra na 1ª Plenária das Populações Negras do Sul da Bahia no dia anterior(21/10), organizada pela associação dos terreiros.). O fato é, que a de Salvador, é tombada pelo IPHAN desde 1962, a de Ilhéus também é. A de Salvador corre sérios riscos de desabamento, a de Ilhéus…(sem comentários).
A finalidade daquela matéria era sensibilizar, para que os órgãos públicos, realizassem as obras que impeçam o patrimônio de desaparecer.
O crime que tento aqui tipificar, lembrando desta matéria em particular é de que na matéria, o autor, coloca a igreja de Nossa Senhora da Escada “como de características únicas, e a assemelha a outras construções jesuíticas da época , a exemplo da Igreja de São José do Jenipapo, no município de Castro Alves, de Nossa Senhora D’ajuda, em Cachoeira, e de Santo Antônio dos Velásquez, na Ilha de Itaparica”. Curioso, é que sobre nossa igreja, aqui, nenhuma virgula, ou se quer referência, por mais abstrata que fosse.
A dicotomia que quero fazer sobre este assunto, com o da manchete, TERREIRO DE ODÉ ,TOMBADO E ESQUECIDO, é que ,da mesma forma, que os historiadores, e os poderes públicos, sejam de qualquer esfera, tratam as igrejas, casarões, e patrimônios culturais,tratam também e principalmente os terreiros de Candomblé, até por resquícios dos preconceitos , discriminações e estereótipos eurocêntricos, impostos a nós, e maquiados com essa falsa idéia de DEMOCRACIA RACIAL.
Enquanto o governo do estado, em cerimônia no dia 25 de julho tombava o quarto terreiro de candomblé no estado da Bahia,(o Ilê Axé Opô Aganjú, localizado em Lauro de Freitas, o Terreiro de Odé, permanece de portas fechadas, com todo o seu acervo arquitetônico, histórico, cultural, turístico e imaterial ,em risco de extinção, e a comunidade ilheense, acadêmica, os visitantes e turistas, tolhidos de seu direito primeiro, de conhecer a sua história, as suas origens. Antes foram tombados o São Jorge Filho da Goméia, localizado em portão, também em Lauro de Freitas, o Pilão de Prata, e o Ilê Axé Oxumaré, estes localizados em Salvador, respectivamente na Boca do Rio e Federação.
Enquanto o Opô Aganjú, fundado em 1972 é tombado, o que é de suma importância para a preservação do patrimônio histórico e cultural, herdados dos povos da diáspora africana, o Terreiro de Odé, fundado em 1942 permanece esquecido, como a Igreja de Nossa Senhora Santana, a União Protetora dos Artistas, o Museu do Cacau, etc, etc, etc…
Vale ressaltar que apesar de todos os percalços, e “esquecimentos”, o governo municipal atual, está dando uma atenção especial ao caso. A pedido da Associação dos terreiros de Candomblé, já providenciou a segurança para o local, a fim de evitar a depredação do patrimônio tombado, e está analisando, um pedido da entidade, para assinatura de um protocolo de intenções e termo de compromisso do executivo municipal com a referida entidade e a proprietária do Imóvel a senhora Araci Faria, filha consangüínea do saudoso Pai Pedro, e herdeira legal e legítima do legado e patrimônio material e imaterial deixado por ele, sim, pois ela, é hoje a Nêngua de Inkisse do terreiro de Odé, cargo que recebeu de Mameto Dandalunna(Oxun) e desempenha com total seriedade e responsabilidade.
A intenção da Associação dos Terreiros, e da proprietária do imóvel, corroborado pela Diretora Presidente da Fundação Cultural de Ilhéus, a competentíssima senhora Adriana Castro, especialista em patrimônio cultural, é transformar o Terreiro de Odé, em um Centro Cultural de referência para o estudo, a pesquisa, a divulgação e o fomento da história, e a cultura dos povos da Diáspora Africana, que vieram para o Sul da Bahia, uma espécie de museu interativo, onde tudo vai estar em constante interação com os visitantes, inclusive servindo também para a formação de professores da rede municipal e estadual de ensino para a aplicação da lei 10639/04, que obriga a inclusão nos currículos escolares da história da África dos Afro descendentes.Com esta atitude, realizar-se à pedido do saudoso Pai Pedro feito em vida, a sua filha, e alguns dos seus mais íntimos amigos, além da expressão pública de sua vontade em entrevista coletiva a imprensa concedida a Janete Badaró, mais ou menos em 1998, na assessoria de imprensa da Prefeitura, quando ainda tinha somente 28 anos de serviços prestados aquela instituição, com os diversos cargos que ocupou, como: chefe de Gabinete, oficial de Gabinete(esses dois ele iria ocupar por 13 de mandatos de prefeitos diferentes), Chefe de serviço de Limpeza Pública e Arborização, pagador, tesoureiro, chefe dos postos médicos.
Embora no prisma dos responsáveis em escrever a nossa história para “perpetua-la para as gerações vindouras”, não haja referências à história de nossa cidade, e a importância de nossos patrimônios na construção da Bahia de todos os Santos, necessário se faz, incluí-la na agenda de discussões, para que não continue esquecida , principalmente para os nossos conterrâneos, pois desde o século XVIII, estamos, como bem disse a professora Maria Luíza, contribuindo para o enriquecimento de nossa Bahia. Da mesma forma, não podemos deixar de incluir na agenda política de discussões a criação da Coordenadoria Municipal para Promoção da Igualdade Racial no município, o que inclusive faz parte do Termo de Adesão, assinado pelo município com o governo federal em julho deste ano,e que, com certeza, facilitará, não só o entendimento entre governo e a sociedade civil, sobre a implantação das políticas de ação afirmativa no município, (o terreiro de Odé é um Exemplo), como também das ações estruturantes, como geração de trabalho e renda para as comunidades tradicionais, políticas de empreendedorismo, melhoria da qualidade no ensino, acesso e permanência destas comunidades na escola até completar o segundo grau, além das políticas compensatórias e reparatórias, a exemplo de cursos pré-vestibulares institucionais para comunidades tradicionais, e reserva de cotas nas empresas a se instalarem em nosso município, para as comunidades tradicionais (negros, índios, judeus, árabes, palestinos, ciganos, amarelos e outros).
Valério Bomfim é formado em magistério pelo instituto municipal de ensino Eusínio Lavigne, no ano de 1998, funcionário público municipal, efetivo do concurso 002/98, é ó gà do Ilê Axé Logunedé na conquista, secretário executivo da (Yabás) Associação dos Templos de Culto aos Orixás do Sul da Bahia, fundada por ele em 2002, militante atuante do movimento negro desde 1992, assessora desde abril passado, o presidente da comissão especial para políticas de promoção da igualdade racial da câmara de vereadores de ilhéus, vereador Rodolfo Macedo, nos assuntos inerentes ao tema, tendo inclusive participação decisiva na montagem dos projetos de lei que criaram a comissão e o conselho municipal e é articulador da rede kodya( comunidades organizadas da diáspora africana, para o sul da Bahia), uma ong, que presta serviços de consultoria a outras ongs para montagem de projetos e captação de recursos, nas áreas de inclusão social, digital e principaqlmente nas políticas de segurança alimentar e nutricional, esta ong conta com mais de 700 terreiros de candomblé em Salvador e mais de 70 quilombos em toda a Bahia, além de grupos de capoeira.