Aposentada de 100 anos faz curso de alfabetização em Ilhéus

Sacola de livros pendurada no ombro e uma bengala para se apoiar por causa de uma dorzinha no joelho direito, Enedina Pereira da Silva, 100 anos, todo dia, desde junho, sai de casa para estudar. Ela é aluna do programa Todos Pela Alfabetização (Topa), em Ilhéus.
Falante e animada, Enedina Silva vive de bem com a vida. Ainda bebe uma cervejinha, gosta de dançar e diz que não morre sem escrever seu nome. “Quero isso e muito mais e rogo a Deus pelos que estão me ajudando”, diz.
Ela conta que trabalhou a vida toda como doméstica ou quebrando cacau, nas roças do sul da Bahia. Agora, fala com entusiasmo das primeiras experiências como estudante. “Nunca peguei num lápis e agora estou escrevendo com caneta”.
No dia de seu centenário, em 27 de setembro, foi homenageada por professores e colegas e até interrompeu uma entrevista com jornalistas para atender ao telefonema do governador Jaques Wagner. “Ele disse que mesmo aos 100 anos eu ainda tenho a voz firme”, relatou.

A vida de estudante mudou a sua rotina. Ela já não se recolhe cedo para descansar. As aulas vão das 18 às 20 horas, mas ela sai de casa uma hora antes, acompanhada do filho Lourival, que também está sendo alfabetizado, para andar os mais de 500 metros de sua casa até o Centro Comunitário do bairro Teotônio Vilela, sede do Topa.

Esforço – Na escola, é admirada pela disposição. Enedina Silva ainda faz todos os serviços de casa e se alimenta bem. “Em vez de café da manhã, todo dia bato um bom prato de feijão”. Após o almoço, gosta de descansar vendo televisão, mas seu aparelho quebrou.

Enedina Silva nasceu na Fazenda Ventura, em Itabuna, em 1909. Aos 7 anos, perdeu os pais e foi morar com parentes, no distrito de São João do Panelinha, em Camacan. Ela diz que namorou muito, mas não se casou. Engravidou aos 39 anos do único filho, Lourival Rodrigues dos Santos, de 61 anos, mas o companheiro, Júlio Rodrigues dos Santos, a abandonou.

“Ele registrou, mas eu criei sozinha, com os calos de minhas mãos, para dar o essencial e ele não precisar pegar no alheio”, diz. Em 1962, se mudou para Itabuna, para trabalhar num hotel. “Era um tempo duro. A gente tinha que andar de lata na cabeça, para lavar roupas e pratos no Rio Cachoeira. O bom é que a gente pegava muito peixe”, relata. Quando ficou sem emprego, foi morar em Eunápolis, depois voltou para Panelinha. Em 1988, mudou-se para Ilhéus. Há um ano, mora com o filho num barraco de madeira no Sítio Olândia, bem próximo do manguezal do Rio Cachoeira. Os dois sobrevivem com a aposentadoria dela como ruralista e do que pescam.

“Ainda pesco de tudo, só não meto a mão no buraco do caranguejo”. O sítio pertence a um casal amigo. Foi a dona da propriedade, que é professora, quem a convenceu a estudar. Enedina vai concluir o curso de alfabetização no final do ano. “Se quiser continuar, ela pode se matricular em uma turma de Educação para Jovens e Adultos (EJA)”, explica a supervisora do programa na Direc-6, Lúcia Helena Gomes Rosa.

Ana Cristina Oliveira, da Sucursal Itabuna – A TARDE

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *