A notícia não ganhou destaque no Sul da Bahia, mas a implantação de corredores de exportação para o escoamento da produção de grãos da região Oeste da Bahia através do Porto de Aratu, em Salvador, pode significar a desmobilização e a ociosidade para o Porto de Ilhéus. Somente por ele passaram em 2004 cerca de 900 mil toneladas de soja embarcadas para o mercado europeu, com ênfase para Alemanha, Holanda e França, segundo Ravi Montalvão, autor de uma monografia na FTC sobre a exportação de soja através do porto ilheense.
Com o projeto, os grãos produzidos na região do oeste baiano teriam como corredores de exportação as BRs 242,116 e 324, que necessitam de uma total recuperação, pois estão sem condições normais de trafegabilidade, ficando de fora a BR 415. E explica que com base nos estudos do Programa Estadual de Logística de Transportes da Bahia, o secretário Eraldo Tinoco mostrou no simpósio de Juazeiro as disfunções existentes nos fluxos de escoamento dos produtos e as soluções e alternativas mais viáveis.
Para Ravi Montalvão, com este enfoque, o roteiro da soja, a partir dos municípios de Luís Eduardo Magalhães e Barreiras, segue para o Porto de Ilhéus e não para a Baía de Aratu, apenas em função da vida útil ultrapassada da BR 242. A alegação do projeto de transferência dos embarques para o porto de Aratu é de que os roteiros da soja e de fertilizantes já não coincidem, causando prejuízos aos produtores. Entretanto, os estudos levam em conta cinco opções logísticas que incluem até o uso do transporte ferroviário, mas sem que nenhuma delas contemple o porto ilheense.
Monografia
A monografia apresentada agora em agosto, na FTC, parte do pressuposto de que os importadores chineses recusaram, até o início de junho de 2004, nada menos que 239 mil toneladas de soja brasileira. Esse volume é o equivalente a quatro navios carregados, sob a alegação de que os grãos continham, além da conta, sementes contaminadas com fungicidas misturadas aos grãos sadios, gerando sérios problemas para produtores, exportadores e mesmo para a diplomacia brasileira. Numa primeira avaliação de especialistas em exportação, os prejuízos chegaram ao patamar de US$ 300 milhões para o país.
O trabalho acadêmico leva em conta o fato observado pelos analistas de mercado de que pela legislação européia, que vinha sendo seguida pelos chineses, o padrão de qualidade permitiria a presença de até três sementes de soja contaminadas para cada quilo de grão, através de um controle amostral de qualidade. Os chineses cobravam a partir da crise, um padrão zero de contaminação, provocando um sério impasse comercial e diplomático, com possíveis reflexos na balança brasileira, que tem na soja o seu principal produto de exportação, gerando em 2003, US$ 4 bilhões em divisas para o país.
O incidente com os chineses, sem dúvida, serviu para que o governo e produtores brasileiros decidissem pela implementação de um modelo de controle mais rígido sobre a qualidade da soja comercializada para o mercado internacional e mercado interno. Também ficaram definidos critérios para a exportação de soja transgênica (geneticamente modificada), cujo plantio foi legalizado ano passado, através de uma polêmica medida provisória assinada pelo vice-presidente da República no exercício da presidência, José Alencar.
Avanço
Para o autor da pesquisa, sem dúvida o avanço do cultivo da soja no Oeste baiano criou uma alternativa que evitou a ociosidade da unidade portuária de Ilhéus, que até a década passada era um importante centro exportador de cacau e derivados. Como conseqüência da vassoura-de-bruxa, que deixou um rastro de 250 mil desempregados e reduziu a produção brasileira de 400 mil para menos de 100 mil toneladas anuais, as exportações de amêndoas, manteiga e licor de cacau foram reduzidas de 49.607 toneladas em 1996, para apenas 4.500 toneladas, o que representa uma queda real de mais de 91%.
Já a soja vem apresentando um crescimento contínuo, saltando de 68.808 toneladas em 1995 para 900 mil toneladas em 2.004, com um crescimento real de 1.307% O bloqueio chinês não afetou em nada a movimentação da base portuária de Ilhéus, porque a grande parte dos embarques de soja é direcionada para países do continente europeu. Enquanto a exportação de madeira, uma atividade em expansão até 1995, com a movimentação de 259.146 toneladas, caiu a zero nos últimos sete anos, registrando apenas um embarque de 299 toneladas no ano 2000.
O estudo aponta ainda que o crescimento das exportações de soja está gerando novos investimentos portuários no Porto de Ilhéus, com a ampliação da área de manobras do porto – o dolphin -, além da construção de mais 80 metros de cais e de um retroporto, o qual deverá gerar uma área adicional de 100 mil metros quadrados para a movimentação de cargas. O autor acredita que existe também uma expectativa com a possibilidade de crescimento das exportações de cacau através da unidade portuária ilheense, o que depende de forma direta dos resultados do programa de recuperação da lavoura cacaueira e que tem como gargalo maior a falta de recursos para produtores descapitalizados e que têm sérias dificuldades de acesso ao crédito.
Como recomendações, Ravi Montalvão sugere no estudo que nesse novo cenário do comércio internacional, se o Brasil pretende aumentar suas exportações agrícolas, conquistar e manter novos mercados, deverá estruturar a sanidade animal e vegetal de forma a dar credibilidade a suas ações e produtos.
Segundo ele, o processo passa pela conscientização dos produtores agrícolas por meio de seminários, palestras e da mídia escrita e falada sobre a importância de se evitar a entrada de pragas no país e as mudanças na segurança biológica de cada país. Também acredita ser importante a intensificação da fiscalização e ampliar comunicação de risco entre os cientistas, o sistema produtivo e a sociedade, de modo a elaborar sistemas informatizados de alerta de pragas que podem colocar em risco as áreas de produção agrícola, de estratégias de defesa agropecuária durante processos de exportação e importação e de inovações que surgirem resultantes das normas internacionais de medidas fitossanitárias. Na área logística, sugere a melhoria da malha viária e do sistema portuário, eliminando os gargalos e o aumento do custo Brasil.
O que Ravi teme agora, é que com os estudos para transferir os embarques de soja para o Porto de Aratu, em Salvador, acabe inviabilizando o terminal ilheense. Segundo ele, o porto é considerado um importante equipamento para o desenvolvimento regional, que já foi duramente afetado pela crise do cacau e pela desmobilização do terminal de tancagem da Petrobras, que implantou um oldeoduto interligando Madre de Deus a Itabuna e Jequié. Esvaziado, o porto poderia ser transformado num verdadeiro elefante branco com prejuízos econômicos e sociais.
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