As ruas vazias num dia de feriado chuvoso em Ilhéus contrastavam com o grande “tsunami” nos bastidores da política local, em função das denúncias ainda não confirmadas oficialmente de que o prefeito Valderico Reis, sem partido, foi gravado e filmado pagando um “mensalinho,” a versão ilheense do escândalo nacional que atinge ao PT, a um grupo de vereadores da Câmara Municipal. As provas já estariam sendo inclusive encaminhadas à Polícia Federal e ao Ministério Público com a fita gravada que comprova o crime, mas as denúncias são descartadas por assessores do prefeito que a consideram simplesmente um blefe. O saldo de tudo isto até agora será a exoneração hoje, de dois secretários: Ozéias Gomes e Jorge Viana Dias da Silva.
Mas como pano de fundo da expulsão, ainda em entrevista ao Agora, o deputado Geddel Vieira Lima contou que tomou conhecimento em detalhes de um possível escândalo que poderia ter dimensão nacional, através de uma série de irregularidades no governo ilheense, como o pagamento de compra de baby doolls e peças íntimas com recursos públicos, além da existência de rumores sobre o pagamento de “mensalinho” para vereadores, uma espécie tupiniquim de “mensalão”, que vinha sendo pago a deputados em Brasília através do rico caixa 2 do PT.
Rumores
Na cidade, durante todo o dia os rumores circulavam com todo vigor. O grupo governista esteve demoradamente numa tensa reunião e à tarde, foi confirmado o afastamento dos secretários Ozéias Gomes, de Administração, e de Agricultura, Interior e Pesca, Jorge Viana Dias da Silva, que hoje entrega ao prefeito o seu pedido de exoneração. Embora os boatos dessem conta de um estremecimento nas relações do vice-prefeito Newton Lima com o prefeito, ele continua mantido no cargo de secretário de esportes pelo menos temporariamente.
Com os dois afastamentos anunciados ontem, durante a tormenta das denúncias, chega a nove o número de secretários afastados na atual gestão de Valderico Reis, que registra o recorde da demissão de um secretário a cada 25 dias, um indicativo da permanente tensão no âmbito do governo municipal, que vem apresentando sérios desgates e deu lugar ao surgimento do Movimento pela Ética na Política de Ilhéus (MEP), que divulga na Internet um leque de denúncias contra o governo municipal.
Há quem afirme no grupo governista, que o prefeito Valderico Reis também está se sentindo traído e aponta na origem das denúncias um possível complô que seria montado por um dos seus aliados, também já exonerado, mas que teria sido correligionário do ex-prefeito Jabes Ribeiro, a quem também teria abandonado ainda no final do seu governo para assumir um importante cargo na gestão do PMDB em Ilhéus.
Um expressivo líder oposicionista esteve reunido com assessores e agentes políticos do seu partido para uma avaliação do termômetro da crise no dia de ontem e considerou que “este governo chegou ao fim mais cedo do que esperávamos.” Ele também aguarda o desfecho da crise, que é rica em denúncias, mas não se concretizou em provas formais, com a divulgação da referida gravação.
A Câmara de Ilhéus, que foi referenciada como o epicentro da crise, não funcionou na tarde de ontem, em função do feriado, mas vereadores do governo e da oposição procuravam mais informações sobre o caso, que depois de denunciado pelo Agora, também ganhou espaço na coluna política de Samuel Celestino em A Tarde e foi transcrita no site do MEP.
Dizendo que deixa o cargo com a consciência tranqüila de quem cumpriu o dever, Jorge Viana saiu atirando e destaca que “no momento em que meu partido abre processo de expulsão do prefeito Valderico Reis, alegando motivos éticos e morais, não me resta alternativa senão me desligar do governo, pedindo exoneração da Secretaria de Agricultura, Interior e Pesca.” Em paralelo, ele faz um balanço das ações que realizou, falando do apoio incondicional que conseguiu do deputado Geddel Vieira Lima, que colocou o seu prestigio a serviço de Ilhéus para solucionar uma série de questões e pendências na área federal.
Repercussão
Já o jornalista Marcos Correia, do Diário de Ilhéus, vê algumas contradições nas denúncias, porque embora os rumores dêem conta de que apenas três vereadores não aderiram ao “mensalinho”, “o prefeito tem uma oposição forte no Legislativo, onde enfrenta duras críticas de oito dos 13 vereadores, o que é muito estranho.” Ele conta que a cidade foi transformada numa central de boatos e durante os mais de 20 minutos em que conversou com a reportagem do Agora, recebeu pelo menos três telefonemas em sua residência de pessoas da oposição e da situação, sempre comentando sobre os bastidores da política ilheense.
O empresário Hans Schaep-pi, que atua na área de turismo, evitou discretamente comentar sobre o escândalo ilheense. Ele conta que “ainda não fui informado inteiramente do caso, estava viajando e cheguei ainda ontem a Ilhéus. Sei apenas o que li nos jornais, inclusive no Agora.”
A estudante Karina Santos contou que precisa se informar ainda mais sobre o caso, “soube apenas através de comentários de amigos, mas acho que tem de ser apurado, porque é uma denuncia séria e grave.” Ela considera que o problema é similar ao que acontece em Brasília e que agora atinge diretamente aos políticos ilheenses.
MEP ingressa com ação no MP
Magno Rogério Carvalho Lavigne, presidente do Movimento pela Ética na Política de Ilhéus, juntamente com o vereador Alisson Mendonça, entraram com uma representação no Ministério Público em Ilhéus contra Valderico Luiz dos Reis, prefeito de Ilhéus, e contra a secretaria de Governo, Luciana Reis, que em fevereiro de 2005 teria tomado em regime de adiantamento de pequenas despesas para a sua secretaria a quantia de R$ 8 mil e prestou contas em 02 de maio de 2005, através da CI (Comunicação Interna) nº. 347/05.
Na prestação de contas, o MEP denuncia a existência da nota fiscal nº012547, da empresa Sex Apeel, do dia 02 de maio de 2005 e no descritivo da nota encontra-se “um short doll”, ou seja, “com o dinheiro público foi comprada uma peça íntima de uso “muito” privado, já que a referida loja é na verdade um Sex Shop, onde é vendida toda a sorte de produtos eróticos”, segundo o documento encaminhado pelos denunciantes.
AGORA