Os quilombolas e caiçaras vivem atualmente o conflito de serem valoriza-dos por terem contribuído com a preservação do ambiente e ao mesmo tempo são impedidos de realizar atividades tradicionais,como a roça de coivara e o extrativismo do palmito. Já os indígenas enfrentam o problema da própria extinção, não só culturalmente, mas numericamente, a cada dia diminui o número de indivíduos nas aldeias indígenas, em função das péssimas condições de vida.A expectativa de vida dos indígenas nos Brasil é de 42,5 anos, enquanto que a de um brasileiro médio é de 67 anos, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde).
O respeito aos direitos e aos conhecimentos adquiridos dos primeiros grupos culturais do país é também uma da mais eficazes formas de conservar e promover a rica diversidade biológica e cultural do litoral brasileiro.
Quilombos
Um dos povos mais representativos desse processo de interação pacífica entre ser humano e natureza são os quilombolas, que são as comunidades rurais negras, inicialmente formadas por ex-escravos. Os quilombos ou mocambos seriam não só povoações fundadas por negros fugidos, mas também redutos de alforriados e livres com a passagem do trabalho escravo para o livre.
Os mocambos são chamados também terras de pretos, comunidades negras isoladas ou remanescentes de quilombos. Existem cerca de 500 quilombos no Brasil. O mais famoso é o dos Kalungas, em Goiás, negros que vivem de escambo e têm um rei simbólico.
As terras das comunidades remanescentes de quilombos estão sob constante ameaça de invasores como fazendeiros, madeireiros, mineradoras, garimpeiros. A partir desta questão de impacto social, em 1988, entidades do movimento negro propuseram que a Constituição do Brasil garantisse para as comunidades negras rurais as suas terras. A proposta foi aceita e o artigo 68 reconhece às comunidades remanescentes de quilombos o direito a propriedade de suas terras.
Na região conhecida como Vale do Ribeira, localizada no sudeste do Estado de São Paulo, há cerca de 50 dessas comunidades. Sua origem tem referências no século XVII, por conta da atividade mineradora que imperou naquele período da história. No Porto de Iguape desembarcaram os escravos africanos vindos para trabalhar na região nas atividades de mineração. Com o fim do ciclo do ouro, muitas daquelas pessoas permaneceram no local. Com as condições locais e a convivência coletiva, foi sendo construído um modo de vida específico, com características culturais que prevalecem até hoje.
Cada família possui uma área demarcada e em cada um dos sítios familiares há áreas de terras de uso, áreas que são mantidas como capuavas, ou seja, que possibilitam o descanso da terra de lavoura, e áreas onde a vegetação se mantém, onde em determinados momentos se realiza o extrativismo.
Apesar de todos os problemas que enfrentam, os quilombos tem se estruturado de maneira a resistir às pressões e fazer valer as suas conquistas. Uma das formas encontradas foi a sua organização em torno de associações de quilombos. No processo de seu reconhecimento coletivo como descendentes de escravos e sujeitos sociais que tiveram papel fundamental na preservação da maior área de Floresta Atlântica ininterrupta do país, esta população se organiza propondo alternativas que viabilizem a sua permanência no local e a conservação do meio ambiente.
Caiçaras
O termo “caiçara”, de origem tupi-guarani, é traduzido para o português como cerca para proteção, curral ou armadilhas para pesca e caça. É usado também para designar um dos primeiros grupos culturais nacionais: o dos mestiços de índios e portugueses que passaram a ocupar um faixa litorânea do território nacional, correspondente ao que hoje compreende os estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná.
O grupo tem sua origem na união de indígenas perseguidos e escravizados pelos europeus com portugueses marginalizados do processo oficial de ocupação da nova colônia. Essa perseguição proporcionou o distanciamento dos outro núcleos populacionais do período.
A conseqüência desse isolamento permitiu ao grupo caiçara uma independência econômica e cultural, mesclando técnicas e conhecimento europeus e indígenas e dessa forma otimizando o aproveitamento dos recursos naturais da Mata Atlântica e de seus ecossistemas associados, como restingas, mangues e corpos d’água.
Os caiçaras podem ser caracterizados pelo desenvolvimento de um complexo sistema de atividades que se complementam, destacando-se a agricultura de coivara, o extrativismo vegetal, a caça, a coleta de moluscos e crustáceos e a pesca, seja em rios, lagunas ou mar aberto.
A forma de exploração do recursos naturais, os meios de produção simples, a baixa ocupação demográfica e o aspecto cultural de produção de poucos excedentes, além de seu profundo conhecimento do meio natural, determinaram que fossem importante agentes da conservação ambiental.
O seu processo de empobrecimento e perda da identidade sócio-econômico-cultural deu-se em função do destino de novos usos para a faixa litorânea com a expansão de frentes urbanas, industriais e agropecuárias, inclusive pelas áreas de turismo e lazer, além da criação da unidades de conservação de características restritivas.
A conseqüência desse processo, de implantação de pólos industriais, construção de casas e estruturas turísticas, além da exploração sem critério dos recursos naturais, acarretou, num período muito curto, danos ambientais muito mais graves do que os causados pelos indígenas, caiçaras e quilombos durante séculos de ocupação.
Como resultado dessa seqüência de desrespeito aos seus direitos, centenas de comunidades entraram em processo de empobrecimento e de maior dependência da economia de mercado. As alternativas para grande parte dos que resistiram em suas áreas tradicionais foram a de trabalhar como empregados na construção civil, pesca industrial, caseiros, ou como extrativistas/coletores de recursos naturais de alto valor de mercado, tais como palmito, camarão, ostra, madeiras nobres, e na maior parte do tempo trabalhando de forma clandestina.
Por outro lado, nos últimos anos, as comunidades caiçaras, com o auxílio das ONGs ambientalistas têm conseguido lutar para que seus direitos sejam reconhecidos, propiciando a implantação de novos modelos de desenvolvimento, baseados no acervo de conhecimentos e com princípios ambientais para a sustentabilidade da Mata Atlântica.
Indígenas
Originalmente ocupavam o litoral brasileiro dezenas de nações indígenas entre elas os Guaranis e Kaingang (SP, PR), os Potiguara (ES), os Pataxó (BA), entre vários outros grupos já extintos, como os Comboios e os Guainazes. As populações indígenas possuem um conhecimento especial das plantas nativas da floresta, que usam como remédios eficientes no tratamento de muitas doenças.
O modo de vida específico desses povos permaneceu inalterado por milhares de séculos. Sofreu a primeira ameaça quando os europeus chegaram às costas brasileiras, no início do século XVI. Naquela época eram 3,5 milhões de indígenas que aqui habitavam e hoje restam não mais do que 300 mil, distribuídos em aproximadamente 200 grupos étnicos, com características peculiares e idiomas distintos.
Hoje e sempre, as nações indígenas têm várias reivindicações: reclamam seus direitos coletivos sobre suas terras, direitos de decidirem sobre seu futuro e participarem das decisões que os afetam, direitos ao usufruto exclusivo das riquezas do solo e do subsolo, direitos à organização e canais de representação, direitos individuais, entre vários outros que afetam a sua identidade cultural e a sua sobrevivência enquanto os primeiros e verdadeiros brasileiros.